Com praticamente todo o universo da Justiça brasileira digitalizado, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) se prepara para lançar, na primeira semana de dezembro, no Encontro Nacional do Poder Judiciário, um portal de serviços, com a promessa de garantir a consulta processual unificada para todos os usuários externos, em qualquer lugar do país.
O JUS.BR poderá ser considerado um divisor de águas no acesso à Justiça e um exemplo singular de como a evolução da digitalização e do uso da inteligência artificial pode ser decisiva para o funcionamento do Judiciário, que recebeu, apenas no ano passado, 35 milhões de novos processos.
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O portal prevê a criação de uma central de comunicações do Poder Judiciário, com o domicílio judicial eletrônico, que faz a citação inicial do processo, de forma eletrônica, e com um diário de justiça eletrônico nacional, com as intimações de todos os sistemas num só local.
“Eu vou ter um ambiente em que consigo, a partir do CPF, CNPJ, o número do processo ou o nome do advogado fazer uma consulta nacional em todos os sistemas do país, com visualização do processo. Tudo isso vai chegar ao usuário final. Seja o cidadão que quer ver o seu processo, o advogado, o Ministério Público, as Defensorias Públicas, os usuários externos de uma maneira geral”, explicou o coordenador do Programa Justiça 4.0, Dorotheo Barbosa Neto, em entrevista à newsletter Por Dentro da Máquina.
O magistrado explica que o público externo poderá acessar o portal de serviços com uma entrada única, utilizando o gov.br. O projeto ainda prevê a criação do peticionamento intercorrente unificado. De acordo com o coordenador do Justiça 4.0, será possível peticionar, em um único lugar, para todos os processos que já estão em trâmite no Brasil.
“Acaba aquela questão… O processo subiu do Juizado Especial Federal para o TRF. Vou ter que mudar o sistema. O processo subiu do TRF para o STJ. Vou ter que usar outro sistema. Não. Agora será tudo centralizado para o portal de serviços. E isso vai chegar na primeira semana de dezembro”, afirma Dorotheo, juiz auxiliar da presidência do CNJ.
Em uma etapa posterior, que deve chegar ao público até o final do primeiro semestre de 2025, o CNJ pretende lançar o peticionamento inicial unificado para qualquer tribunal do país. Essa funcionalidade, porém, depende ainda da evolução de um dos pilares do desenvolvimento tecnológico do Judiciário: o serviço de notificações entre os diferentes sistemas informatizados.
Integração e inteligência artificial
Nos últimos quatro anos, com algumas correções de rota, a equipe do CNJ, em parceria com os tribunais de todo o país, azeitou a integração entre as mais diferentes fontes de informação, passo crucial para entender como se chegou até aqui.
Nesse período, duas plataformas ganharam volume e criaram as condições para a construção do portal de serviços: o Codex, a plataforma oficial de extração de dados estruturados e não estruturados dos processos judiciais eletrônicos, e a Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br), que sustenta o processo de autenticação, a “loja” de aplicativos e o sistema de notificações.
Nesse formato, o CNJ hoje já consegue unificar, com segurança, informações de 93 tribunais e conselhos (CNJ, CSJT e CJF) e tem acesso a 217 das 221 fontes de dados que hoje abastecem o Judiciário. De um universo de 291 milhões de processos, em tramitação ou arquivados, o Codex já armazena 285 milhões.
De acordo com o CNJ, a plataforma reúne 99% dos processos e mais de 70% dos documentos que circulam no Judiciário.
Embora o portal de serviços do Poder Judiciário seja um poderoso instrumento, ele não cumpre a lacuna que a inteligência artificial generativa pode preencher na Justiça, em especial na atividade jurisdicional, tema que suscita importantes debates sobre ética, segurança e custos.
De acordo com Dorotheo Barbosa Neto, as principais inovações nesse sentido ainda precisarão aguardar o processo de regulamentação do uso da IA, seja no âmbito do próprio CNJ, seja no Congresso Nacional, sob pena de serem feitos em descompasso com as normas que vão determinar como essa tecnologia deverá ser utilizada. Isso sem contar a barreira dos altos investimentos.
“A gente vai ter que esperar para ver o que vem de lá. Na minha opinião, qualquer regulação deveria regular o uso e não a formação (da tecnologia). A formação de dados qualificados. A garantia de não utilização para reaprendizado de dados, por exemplo, de entes públicos, como o Judiciário. É possível fazer isso. Contratualmente, é possível você fazer isso. Uma regulação onde você fixa os princípios gerais, e depois ajusta com a evolução dessa tecnologia”, afirma o coordenador do Justiça 4.0.
Dorotheu explica que, recentes análises de mercado demonstram que, para além dos desafios da regulação da IA, os custos de contratação ainda são proibitivos. A instalação de um sistema de busca de precedentes nos tribunais superiores, com todo o cuidado exigido pela Justiça, poderia custar tão caro quanto toda a nuvem que armazena os dados do CNJ.